23 ago 2023 - 12h18

A mudança nas regras do STF e os princípios da governança.

Como a mudança de regra, determinada pelo Superior Tribunal Federal, afeta a sociedade e os princípios da governança no que diz respeito à suspeição de juizes – no trato de processos defendidos por bancas de advocacia em que seus cônjuges, companheiros ou parentes atuam.

O STF formou maioria para derrubar o inciso VIII do artigo 144 do Código de Processo Civil que determina, o impedimento do juiz em processos “em que figure como parte cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge, companheiro ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, mesmo que patrocinado por advogado de outro escritório”.

Sem entrar em questões ideológicas, que podem vir à tona neste tipo de situação, vamos olhar para aspectos de compliance e tratamento de partes interessadas. Este último, a partir dos princípios da equidade e da transparência, que são princípios da Governança Corporativa e dos cadernos que a regem.

O compêndio de compliance, visa estabelecer regras claras de aderências às normas e princípios éticos, dentro do mundo corporativo e das relações empresariais como um todo, no setor público e privado. Os princípios da transparência e equidade, trazido nos cadernos do IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa) e na CVM (Comissão de Valores Mobiliários) trazido por suas normativas, incluindo a 480, estabelece que, quando no tratamento de partes interessadas, atue-se de forma a não restringir-se o desempenho econômico-financeiro, contemplando também os demais fatores (inclusive intangíveis) que norteiam a ação gerencial e que conduzem à preservação e à otimização do valor da organização. Exemplos seriam:

1) Quando uma empresa tem na figura de seus fornecedores, participação societária ou outros interesses que, o fato de optar por usá-los em sua cadeia de fornecimento pode ser fruto de um favorecimento, não necessariamente em linha com os interesses de seus stakeholders ou da livre concorrência de mercado. Ou ainda, do voto de conselheiros que possam ter interesses individuais em uma questão da companhia junto à qual atuam.

Meu convite à reflexão é de como questões como essas fazem um paralelo com a regra, solenemente, modificada pelos nossos juizes supremos. A partir do momento em que a corte máxima de um país estabelece que a ética e a moral podem ser sopesadas, em detrimento de princípios constitucionais de direito do cidadão, há de se acender na sociedade um sinal de alerta.

Nosso judiciário deveria defender o direito a um julgamento imparcial aos cidadãos que o procuram. Quando isto está em risco, como se esperar que, por iniciativa própria, sócios, acionistas, stakeholders, e a sociedade como um todo, adotem outra postura, que prezem justamente pela imparcialidade, a transparência e a isonomia no tratamento de todas as partes?

Os princípios de isenção e desinteresse são princípios muito caros e necessários, especialmente num país que ainda, por muitas vezes, privilegia o jeitinho, ou os indivíduos que ao embarcarem em más condutas justificam suas ações com, ‘se não for assim, não se trabalha’, ou ‘todo mundo atua desta forma’, ou ‘é a dinâmica do setor’. Tanto se ouviu este tipo de relato nos casos de propinas e caixinhas que vieram à tona na atuação de empreiteiras e concorrências públicas poucos anos atrás.

Minha esperança é que, sejam a iniciativa privada e a sociedade que se posicionem alinhadas à ética e à moral. E que ambas trabalhem de forma evolutiva, não caindo nas armadilhas de ‘passes livres’ – como esse, para o qual o STF formou maioria em seu entendimento.

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